PL 3741/2025 – Deputados

Câm. Legislativa de MG – Autoria de Deputados

Institui o Selo Empresa Amiga do Cuidado, a ser concedido a empresas que
abonem faltas de seus empregados e empregadas para acompanhamento de
filhos tutelados ou pessoas sob sua responsabilidade em atendimentos de
saúde ou compromissos escolares e dá ouras providências.

Institui o “Selo Empresa Amiga do Cuidado”, destinado a reconhecer empresas que abonem faltas de seus empregados e empregadas para acompanhamento de filhos, tutelados ou pessoas sob sua responsabilidade em atendimentos de saúde ou compromissos escolares, e dispõe sobre a obrigatoriedade dos contratos de prestação de serviços continuados firmados pela Administração Pública preverem o abono de faltas para os referidos cuidados.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituído o “Selo Empresa Amiga do Cuidado”, a ser concedido às empresas que adotarem políticas internas de abono de faltas justificadas de seus empregados e empregadas para o acompanhamento de:
I – Filhos(as), tutelados(as) ou pessoas sob sua responsabilidade legal em consultas médicas, exames, internações, tratamentos ou demais procedimentos de saúde que requeiram acompanhamento, mediante apresentação de documentação comprobatória;
II – Filhos(as), tutelados(as) ou pessoas sob sua responsabilidade legal em reuniões escolares ou outras atividades relacionadas ao acompanhamento da vida escolar.
Art. 2º – O “Selo Empresa Amiga do Cuidado” será concedido por órgão competente da Administração Pública Estadual, mediante solicitação da empresa interessada, instruída com documentos comprobatórios das práticas adotadas.
Art. 3º – Os contratos de prestação de serviços continuados firmados pela Administração Pública Estadual deverão conter cláusula que assegure o abono de faltas justificadas aos empregados(as) da contratada para os acompanhamentos de que trata o art. 1º.
§ 1º – Nos processos de licitação, dispensa ou inexigibilidade de licitação de e celebração de parcerias e convênios destinados à contratação de bens e serviços pela Administração Pública Estadual, direta ou indireta, deverá ser exigido, além dos requisitos previstos na legislação aplicável, que as empresas participantes possuam o “Selo Empresa Amiga do Cuidado”.
§ 2º – A Administração Pública Estadual poderá estabelecer, nos editais e processos de licitação, dispensa ou inexigibilidade de licitação de e nos instrumentos de celebração de parcerias ou convênios, critérios de pontuação adicional ou desempate em favor das empresas certificadas com o “Selo Empresa Amiga do Cuidado”, conforme as respectivas práticas adotadas.
Art. 4º – O abono das faltas não acarretará prejuízo à remuneração nem à concessão de benefícios, como vale-refeição ou vale-alimentação.
Art. 5º – Os contratos em vigor na data da publicação desta Lei deverão ser repactuados para inclusão das disposições nela previstas.
Art. 6º – A regulamentação desta Lei, inclusive quanto aos critérios objetivos para concessão, renovação, fiscalização e eventual cassação do selo, será feita por ato do Poder Executivo, no prazo de até 90 (noventa) dias a contar da data de sua publicação.
Art. 7º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 7 de maio de 2025.
Bella Gonçalves (Psol), presidenta da Comissão de Direitos Humanos – Ana Paula Siqueira (Rede), presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher – Andréia de Jesus (PT), vice-presidenta da Comissão de Direitos Humanos – Beatriz Cerqueira (PT), presidenta da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia – Leninha (PT), 1ª-vice-presidente – Lohanna (PV), líder da Bancada Feminina.
Justificação: O presente projeto de lei se insere no escopo de uma transformação política inadiável: reconhecer o cuidado como uma atividade essencial à sustentação da vida, e portanto como responsabilidade compartilhada entre o Estado, o setor privado e a sociedade. A proposta nasce da urgência em construir uma nova cultura institucional e trabalhista, na qual cuidar não seja um fardo individual, mas um direito garantido e valorizado.
Esse projeto é fruto de uma ampla articulação nacional – composta por parlamentares em todas as esferas (municipal, estadual e federal), em diferentes regiões do país – articuladas no movimento Mulheres em Lutas (MEL), que têm construído uma plataforma de enfrentamento à lógica produtivista e patriarcal que historicamente invisibiliza o cuidado e penaliza, sobretudo, as mulheres trabalhadoras que sustentam a vida com pouco ou nenhum apoio. Trata-se de um chamado coletivo a todos e todas que compreendem que uma sociedade justa começa pelo reconhecimento de quem cuida.
Hoje, a legislação federal impõe um limite extremamente restritivo: apenas um dia por ano é permitido, sem prejuízo salarial, para que responsáveis legais levem suas crianças ou adolescentes a uma consulta médica. Não há previsão legal para abonar faltas em casos de internações, tratamentos prolongados ou mesmo para participação em reuniões escolares – momentos fundamentais para o desenvolvimento das novas gerações. O projeto responde diretamente a essa lacuna legal e social, atualizando o arcabouço jurídico à luz da Constituição Federal, que determina como dever da família, da sociedade e do Estado garantir proteção integral à infância e à adolescência (art. 227).
Mas não se trata apenas de um ajuste normativo: este projeto parte de uma realidade concreta e inegável. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (2022), o Brasil conta com mais de 11 milhões de mães solo, sendo 90% delas mulheres negras. A maioria vive em domicílios monoparentais e é a única responsável pelo sustento e cuidado de seus filhos. São mulheres que enfrentam jornadas duplas, ausência de rede de apoio e um mundo do trabalho que ainda as trata como “desviantes” quando exercem o direito de cuidar.
A situação se agrava no caso das chamadas maternidades atípicas – mulheres que cuidam de crianças com deficiência ou doenças raras – que enfrentam abandono e sobrecarga emocional, física e financeira. Segundo levantamento da Coalizão Brasileira pela Educação Inclusiva e dados da PNAD Contínua/IBGE (2022), cerca de 70% das cuidadoras de pessoas com deficiência são mulheres, e mais da metade delas não consegue manter vínculos formais de trabalho devido à ausência de políticas de apoio ao cuidado. Cuidar, nesse contexto, é também resistir ao abandono e sobreviver em meio à negligência estrutural. A garantia de ausências abonadas para consultas, internações e reuniões escolares é um passo mínimo, mas poderoso, rumo a uma reparação histórica.
Ao propor ação para os entes públicos e mobilizar a adesão das empresas a terem uma política de abono de faltas para os casos de cuidado, o projeto institui um novo parâmetro de responsabilidade social e compromisso com a equidade de gênero. Mais do que premiar boas práticas, ele transforma a contratação pública em instrumento de indução de políticas justas – colocando o Estado como protagonista na transição para um modelo de sociedade que reconheça o valor do trabalho de cuidado como pilar da economia e da vida.
A proposta também encontra respaldo na Política Nacional de Cuidados (Lei nº 15.069/2024), que determina que União, Estados e Municípios devem promover ações que permitam a compatibilização entre o trabalho remunerado e as responsabilidades familiares de cuidado. O projeto, ao: I)  institui o “Selo Empresa Amiga do Cuidado”, a ser concedido às empresas que adotarem políticas internas de abono de faltas justificadas de seus empregados e empregadas para o acompanhamento de atividades de saúde e educação; II) exigir que os contratos de prestação de serviços continuados firmados pela Administração Pública Estadual contenham cláusula que assegure o abono de faltas justificadas aos empregados(as) da contratada para os acompanhamentos dos cuidados; torna efetiva essa diretriz, com foco na corresponsabilidade entre Estado, setor privado e famílias.
Importa lembrar que cuidar é um ato político. Não se trata apenas de uma necessidade privada, mas de um bem público. Valorizar o cuidado é transformar a estrutura do mundo do trabalho e reconhecer que o tempo de cuidar também é tempo produtivo. A vida digna das mulheres – especialmente das mulheres trabalhadoras – depende de uma reorganização radical das prioridades sociais e institucionais. E isso começa por legislar com base na realidade e nas urgências do presente.
O projeto dialoga com outras iniciativas que vêm sendo debatidas nacionalmente, como a proposta de redução da jornada de trabalho para quatro dias semanais e as campanhas pelo fim da escala 6×1, articuladas por movimentos como o Vida Além do Trabalho (VAT). Todas essas frentes convergem para uma ideia comum: um novo pacto social que coloque a vida – e quem a sustenta cotidianamente – no centro.
Por isso, este projeto é mais do que uma proposta legislativa. É um gesto coletivo de reconhecimento e transformação. Um chamado político a todos que acreditam que nenhuma pessoa deve escolher entre cuidar e trabalhar, entre sustentar sua família e acompanhar a vida de quem depende de si. Porque cuidar é um direito. E cuidar de quem cuida é dever de todos nós.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, do Trabalho, de Desenvolvimento Econômico e de Administração Pública para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.