PL 3786/2025 – Deputados

Câm. Legislativa de MG – Autoria de Deputados

Institui a política estadual de proteção integral às mulheres e crianças
em abrigos temporários e permanentes no contexto de desastres naturais e
emergências climáticas, sanitárias ou humanitárias.

Institui a política estadual de proteção integral às mulheres e crianças em abrigos temporários e permanentes no contexto de desastres naturais, emergências climáticas, sanitárias ou humanitárias no Estado de Minas Gerais e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituída a política estadual de proteção integral às mulheres e crianças em abrigos temporários e permanentes no estado, com o objetivo de garantir-lhes a dignidade, a integridade física, psicológica e social, em situações de deslocamento, vulnerabilidade ou acolhimento decorrentes de desastres naturais, emergências climáticas, sanitárias ou humanitárias.
Art. 2º – Para fins de aplicação desta lei, considera-se:
I – proteção integral: o conjunto de medidas voltadas à preservação da vida, dignidade, integridade física, psicológica e emocional, bem como ao acesso a direitos fundamentais de mulheres e crianças em situação de acolhimento em abrigos temporários e permanentes;
II – abrigo temporário: local de acolhimento emergencial destinado a pessoas afetadas por desastres naturais, situações de risco ou calamidades públicas, com estrutura adequada para garantir segurança, higiene, privacidade e atendimento humanizado;
III – abrigo permanente: unidade de acolhimento de caráter continuado, voltada à proteção de mulheres e crianças que não podem retornar aos seus lares por risco à vida, à integridade física ou por ausência de condições mínimas de subsistência e proteção;
IV – vulnerabilidade: condição agravada por fatores sociais, econômicos, raciais, étnicos, territoriais, de gênero, idade, deficiência ou orientação sexual, que aumenta a exposição de mulheres e crianças à violência, à negligência ou à exclusão; e
V – acolhimento humanizado: abordagem que considera a singularidade e a diversidade das mulheres e crianças acolhidas, respeitando suas especificidades culturais, étnico-raciais, territoriais, etárias e orientação sexual, assegurando atendimento digno, escuta qualificada e não revitimização.
Art. 3º – São objetivos da política de que trata esta lei:
I – garantia de espaços de convivência e dormitórios segregados por gênero, assegurada a privacidade, integridade, bem-estar físico, psicológico e emocional e segurança das abrigadas;
II – implantação de protocolos específicos para prevenção, monitoramento e resposta a casos de violência sofrida pelas acolhidas em abrigos temporários ou permanentes;
III – garantia de acesso prioritário a produtos de higiene menstrual e itens de autocuidado;
IV – promoção de canais seguros de escuta qualificada e de denúncia, com articulação aos órgãos competentes, em caso de violência sofrida durante o acolhimento;
V – acolhimento personalizado para gestantes, puérperas, mulheres com deficiência e idosas;
VI – estímulo à participação das mulheres acolhidas no planejamento, gestão e avaliação das ações desenvolvidas nos abrigos; e
VII – atuação de equipe multidisciplinar visando mitigar conflitos ou violência nos abrigos.
Art. 4º – São diretrizes da política de que trata esta lei:
I – promover acolhimento humanizado e seguro em abrigos temporários ou permanentes de mulheres e crianças em situação de emergência;
II – prevenir e enfrentar todas as formas de violência nos espaços do abrigo;
III – assegurar o acesso a direitos básicos como saúde, higiene, alimentação, privacidade e informação;
IV – promover a atuação integrada dos órgãos estaduais, municipais, organizações da sociedade civil e demais órgãos visando garantir uma resposta coordenada e eficaz em caso de violência sofrida em abrigos; e
V – respeitar as diversidades étnico-raciais, orientação sexual, condição de migrante ou refugiada e deficiência, visando mitigar eventual violência e discriminação nos abrigos.
Art. 5º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 16 de maio de 2025.
Andréia de Jesus (PT)
Justificação: O presente projeto de lei visa instituir, no âmbito do Estado de Minas Gerais, uma política estadual de proteção integral a mulheres e crianças em abrigos temporários e permanentes, especialmente no contexto de desastres e emergências. A proposta é uma resposta necessária e urgente frente ao aumento de eventos climáticos extremos e à constatação de que mulheres e crianças, particularmente em situação de vulnerabilidade, enfrentam riscos agravados nesses contextos.
Dados e relatos oriundos de tragédias recentes, como o rompimento de barragens, enchentes, deslizamentos e crises sanitárias, revelam que a ausência de medidas específicas de proteção em abrigos temporários têm resultado em violações graves de direitos humanos, especialmente contra mulheres, crianças e populações marginalizadas.
Segundo dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden)1, o Brasil registrou, apenas no ano de 2023, mais de 1.160 eventos relacionados a desastres naturais, como enchentes, deslizamentos e estiagens prolongadas, afetando mais de 74 mil pessoas, das quais milhares foram encaminhadas a abrigos improvisados. Em Minas Gerais, estados de calamidade pública foram decretados em diversos municípios, em especial na região do Vale do Rio Doce, Zona da Mata e Sul de Minas, como consequência de enchentes severas e do colapso de barragens.
Experiências acumuladas a partir de tragédias como o rompimento das barragens em Mariana (2015) e Brumadinho (2019), bem como os desastres climáticos ocorridos em 2020 e 2022, revelam que a ausência de medidas específicas de acolhimento e proteção tem gerado sérios episódios de violência contra mulheres e crianças nos espaços de abrigo.
A precariedade de infraestrutura, a falta de privacidade, a desorganização dos fluxos de acolhimento e a ausência de protocolos de prevenção à violência tornam os abrigos espaços inseguros para aquelas que já chegam profundamente afetadas pela perda de seus lares, territórios e redes de apoio.
Relatórios da Defensoria Pública da União, da ONU Mulheres, da Câmara Técnica de Assistência Social do SUAS e do próprio Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania apontam a ocorrência de abusos sexuais, exploração, assédio, discriminação, negligência institucional e revitimização em muitos desses espaços, que carecem de protocolos mínimos de segurança, segregação por gênero, apoio psicossocial e canais de denúncia efetivos.
Estudos promovidos pelo Fundo de População das Nações Unidas –Unfpa – e pela Organização Pan-Americana da Saúde – Opas – também alertam para a chamada “epidemia invisível” da violência de gênero nos contextos de crise humanitária, destacando que a probabilidade de uma mulher sofrer violência física ou sexual aumenta significativamente quando deslocada de seu território de origem, especialmente quando não há estrutura pública adequada de acolhimento.
A ausência de uma política estadual estruturada expõe ainda mais a vulnerabilidade de populações específicas, como mulheres indígenas, quilombolas, negras, gestantes, mulheres com deficiência e pessoas LGBTQIAPN+, cujas necessidades específicas muitas vezes são invisibilizadas em protocolos genéricos de resposta a desastres.
Em abrigos lotados, improvisados e desorganizados, a falta de privacidade, a carência de produtos de higiene pessoal (incluindo itens de saúde menstrual) e a inexistência de equipes preparadas em escuta qualificada e enfrentamento à violência de gênero são barreiras reais à proteção integral dessas pessoas.
Portanto, este projeto se fundamenta no dever constitucional do Estado de assegurar a dignidade da pessoa humana, promover os direitos fundamentais e garantir especial proteção a grupos vulnerabilizados.
A aprovação desta Política Estadual permitirá que Minas Gerais se antecipe na proteção de vidas, promovendo o acolhimento digno e seguro nos momentos de maior fragilidade social.
Por meio de diretrizes claras e objetivos específicos, o projeto estabelece o papel do Estado como articulador de políticas públicas intersetoriais, com foco na dignidade da pessoa humano e na resposta qualificada a crises socioambientais.
Diante da realidade cada vez mais frequente de desastres ambientais e da necessidade de uma resposta pública sensível às desigualdades estruturais, solicito o apoio dos nobres pares para a aprovação desta proposta, essencial para a construção de uma política humanitária, justa e protetiva no Estado de Minas Gerais.
1https://www.gov.br/mcti/pt-br/acompanhe-o-mcti/noticias/2024/01/em-2023-cemaden-registrou-maior-numero-de-ocorrencias-de-desastres-no-b rasil#:~:text=O%20n%C3%BAmero%20engloba%20eventos%20de%20diferentes%20magnitudes%2C%20sem%20classific%C3%A1%2Dlos.&text=Em%20rela%C3%A7%C3%A3o%20aos%20alertas%20de,hidrol%C3%B3gicos%20e%201.612%20alertas%20geohidrol%C3%B3gicos.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Delegada Sheila. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 2.348/2024, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.