PL 3861/2025 – Deputados

Câm. Legislativa de MG – Autoria de Deputados

Institui o Selo Empresa Amiga do Cuidado.

Institui o Selo Empresa Amiga do Cuidado, destinado a reconhecer empresas que abonem faltas de seus empregados e empregadas para acompanhamento de filhos, tutelados ou pessoas sob sua responsabilidade em atendimentos de saúde ou compromissos escolares.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituído o Selo Empresa Amiga do Cuidado, a ser concedido às empresas públicas e privadas que adotarem políticas internas de abono de faltas justificadas de seus empregados e empregadas para o acompanhamento de:
I – filhos(as), tutelados(as) ou pessoas sob sua responsabilidade legal em consultas médicas, exames, internações, tratamentos ou demais procedimentos de saúde que requeiram acompanhamento, mediante apresentação de documentação comprobatória;
II – filhos(as), tutelados(as) ou pessoas sob sua responsabilidade legal em reuniões escolares ou outras atividades relacionadas ao acompanhamento da vida escolar.
Art. 2º – O Selo Empresa Amiga do Cuidado será concedido por órgão competente da administração pública estadual, mediante solicitação da empresa interessada, instruída com documentos comprobatórios das práticas adotadas.
Parágrafo único – A regulamentação desta lei, inclusive quanto aos critérios objetivos para concessão, renovação, fiscalização e eventual cassação do selo, será feita por ato do Poder Executivo, no prazo de até noventa dias a contar da data de sua publicação.
Art. 3º – Administração pública estadual poderá estabelecer, nos editais de licitação e nos instrumentos de celebração de parcerias ou convênios, critérios de pontuação adicional ou desempate em favor das empresas certificadas com o Selo Empresa Amiga do Cuidado.
Art. 4º – A empresa localizada no Estado que receber o selo de que trata esta lei fica autorizada a utilizar a marca gráfica do referido selo em suas peças publicitárias, em suas embalagens de produtos e em seu site.
Parágrafo único – O uso do selo de que trata esta lei por empresa que o tenha recebido virá acompanhado do ano de sua outorga e da seguinte frase: “O Estado de Minas Gerais reconhece esta empresa como Amiga do Cuidado.”.
Art. 5º – O selo de que trata esta lei terá validade de um ano, podendo ser revogado a qualquer tempo dentro desse período, caso os requisitos para sua concessão deixem de ser atendidos.
Art. 6º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 27 de maio de 2025.
Doutor Jean Freire (PT), responsável da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes na 20ª Legislatura e vice-líder do Bloco Democracia e Luta.
Justificação: O presente projeto de lei se insere no escopo de uma transformação política inadiável: reconhecer o cuidado como uma atividade essencial à sustentação da vida, e, portanto, como responsabilidade compartilhada entre o Estado, o setor privado e a sociedade. A proposta nasce da urgência em construir uma nova cultura institucional e trabalhista, na qual o cuidar não seja um fardo individual, mas um direito garantido e valorizado.
Esse projeto é fruto de uma ampla articulação nacional, composta por parlamentares em todas as esferas (municipal, estadual e federal), em diferentes regiões do país, articuladas no movimento Mulheres em Lutas – Mel –, que têm construído uma plataforma de enfrentamento à lógica produtivista e patriarcal que historicamente invisibiliza o cuidado e penaliza, sobretudo, as mulheres trabalhadoras que sustentam a vida com pouco ou nenhum apoio. Trata-se de um chamado coletivo a todos e todas que compreendem que uma sociedade justa começa pelo reconhecimento de quem cuida.
Hoje, a legislação federal impõe um limite extremamente restritivo: apenas um dia por ano é permitido, sem prejuízo salarial, para que responsáveis legais levem suas crianças ou adolescentes a uma consulta médica. Não há previsão legal para abonar faltas em casos de internações, tratamentos prolongados ou mesmo para participação em reuniões escolares, momentos fundamentais para o desenvolvimento das novas gerações. O projeto responde diretamente a essa lacuna legal e social, atualizando o arcabouço jurídico à luz da Constituição Federal, que determina como dever da família, da sociedade e do Estado garantir proteção integral à infância e à adolescência (art. 227).
Porém, não se trata apenas de um ajuste normativo: este projeto parte de uma realidade concreta e inegável. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (2022), o Brasil conta com mais de 11 milhões de mães solo, sendo 90% delas mulheres negras. A maioria vive em domicílios monoparentais e é a única responsável pelo sustento e cuidado de seus filhos. São mulheres que enfrentam jornadas duplas, ausência de rede de apoio e um mundo do trabalho que ainda as trata como “desviantes” quando exercem o direito de cuidar. A situação se agrava no caso das chamadas maternidades atípicas – mulheres que cuidam de crianças com deficiência ou doenças raras – que enfrentam abandono e sobrecarga emocional, física e financeira. Segundo levantamento da Coalizão Brasileira pela Educação Inclusiva e dados da PNAD Contínua/IBGE (2022), cerca de 70% das cuidadoras de pessoas com deficiência são mulheres, e mais da metade delas não consegue manter vínculos formais de trabalho devido à ausência de políticas de apoio ao cuidado. Cuidar, nesse contexto, é também resistir ao abandono e sobreviver em meio à negligência estrutural. A garantia de ausências abonadas para consultas, internações e reuniões escolares é um passo mínimo, mas poderoso, rumo a uma reparação histórica. 
Ao propor ação para os entes públicos e mobilizar a adesão das empresas a terem uma política de abono de faltas para os casos de cuidado, o projeto institui um novo parâmetro de responsabilidade social e compromisso com a equidade de gênero. Mais do que premiar boas práticas, ele transforma a contratação pública em instrumento de indução de políticas justas, colocando o Estado como protagonista na transição para um modelo de sociedade que reconheça o valor do trabalho de cuidado como pilar da economia e da vida. A proposta também encontra respaldo na Política Nacional de Cuidados (Lei nº 15.069, de 2024), que determina que União, estados e municípios devem promover ações que permitam a compatibilização entre o trabalho remunerado e as responsabilidades familiares de cuidado. O projeto, ao incluir cláusulas nos contratos com a administração pública ou ao exigir o selo como critério para participação em licitações e convênios com o poder público, torna efetiva essa diretriz, com foco na corresponsabilidade entre Estado, setor privado e famílias.
Importa lembrar que cuidar é um ato político. Não se trata apenas de uma necessidade privada, mas de um bem público. Valorizar o cuidado é transformar a estrutura do mundo do trabalho e reconhecer que o tempo de cuidar também é tempo produtivo. A vida digna das mulheres, especialmente das mulheres trabalhadoras, depende de uma reorganização radical das prioridades sociais e institucionais. E isso começa por legislar com base na realidade e nas urgências do presente. 
O projeto dialoga com outras iniciativas que vêm sendo debatidas nacionalmente, como a proposta de redução da jornada de trabalho para quatro dias semanais e as campanhas pelo fim da escala 6×1, articuladas por movimentos como o Vida Além do Trabalho – VAT. Todas essas frentes convergem para uma ideia comum: um novo pacto social que coloque a vida – e quem a sustenta cotidianamente – no centro. 
Esta proposição é um gesto coletivo de reconhecimento e transformação. Um chamado político a todos que acreditam que nenhuma pessoa deve escolher entre cuidar e trabalhar, entre sustentar sua família e acompanhar a vida de quem depende de si. Porque cuidar é um direito. E cuidar de quem cuida é dever de todos nós.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Bella Gonçalves e outros. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 3.741/2025, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.