Câm. Legislativa de MG – Autoria de Deputados
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica instituído o Programa de Prevenção à censura a arte e cultura no Estado de Minas Gerais.
Art. 2º – O Programa de Prevenção a Censura à Arte e Cultura destina-se a prevenir mecanismos que dificultem o acesso da população à Cultura Popular, em especial as que tenham ligação com as comunidades periféricas.
Art. 3º – São objetivos do Programa de Prevenção à Censura a Arte e Cultura:
I – estabelecer mecanismos que impeçam a censura a artistas;
II – garantir o respeito à liberdade de expressão e exposição da realidade através da arte;
III – incentivar a produção da cultura popular nas periferias;
IV – estimular incentivos públicos à cultura favelada e periférica;
V – combater o preconceito às manifestações artísticas vindas das favelas e periferias.
Art. 4º – Fica autorizado o poder público a contratar shows, artistas e eventos que levem a arte e cultura favelada e periférica à população.
Parágrafo único – Fica vedada a censura a artistas que em letras exponham a realidade das favelas e periferias.
Art. 5º – A administração pública no bojo das contratações e fomentos fica impedida de avaliar o mérito das composições artísticas e culturais como critério para o acesso ao recurso público.
Parágrafo único – A análise para acesso ao recurso público deve se ater a questões técnicas e formais, observadas a legislação vigente.
Art. 6º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 18 de junho de 2025.
Bella Gonçalves (Psol), presidenta da Comissão de Direitos Humanos.
Justificação: O presente projeto de lei tem como objetivo impedir a censura a arte e a cultura. Desde 2024 temos acompanhado intensa movimentação de grupos políticos com intuito de cercear o acesso de artistas brasileiros a recursos públicos, em especial artistas que produzam ritmos periféricos da Cultura Popular Brasileira, em especial negros vindos das periferias das metrópoles de nosso país.
O histórico de luta da cultura periférica brasileira é extenso e passa por diversos momentos de repressão e criminalização, vinda do poder público ou por parte significativa da população que não aceita a cultura popular. Na legislação brasileira, em tempos passados já tivemos legislações que restringiam ritmos populares e, especialmente entre a negritude, essa perseguição infelizmente se dá até os dias de hoje. O samba no fim do século XIX e início do século XX foi criminalizado e considerado crime de “vadiagem”, onde os artistas eram considerados vadios e até presos apenas por expor sua arte, ou seja, essa perseguição foi e ainda é recorrente.
Se antes criminalizaram o samba, a partir dos anos 90 e 2000 vimos o rap e o funk também sofrerem perseguições, hoje vemos esses mesmos ritmos e o Trap, vertente do Rap que encanta a juventude atualmente, tem sido o maior alvo de ataques. Há padrões nessas movimentações e vale citar que se trata sempre de ritmos periféricos, fundamentalmente expressos pela população negra, que movimentam multidões e que o poder público acha válido descredibilizar, são inúmeros os casos de artistas de funk nos anos 2000 acusados de apologia ao crime e associação ao tráfico, baseada unicamente em suas músicas. Um dos casos mais emblemáticos foi do DJ Rennan da Penha que foi preso em 2019 acusado de ser olheiro do tráfico, enquanto o mesmo trabalhava como DJ e organizava um baile funk em sua comunidade. Rennan foi absolvido no ano de 2023 por falta de provas que sustentassem a acusação.
Do final do ano de 2024 para o ano presente, grupos políticos começaram a se movimentar de maneira ampla para criminalizar artistas e ritmos musicais, principalmente com o intuito de impedir a contratação de artistas desses ritmos para shows e apresentações pelo poder público. Ação racista que não passa de uma tentativa de censura a cultura popular e periférica. Com a justificativa de que as letras são vulgares ou que fazem apologia a ações ilícitas, mas não vemos a mesma movimentação contra artistas de outros ritmos que cantam letras de teor parecido. A cultura é uma arma importante para disputar a mente da juventude das periferias, porém, o que vemos é a criminalização desta arma, a arte e a cultura salvam vidas e censurar o funk, o rap e o trap vai não só restringir o acesso e as oportunidades que a cultura gera, mas trazer um déficit a cultura produzida pela juventude como um todo.
Nos sobram exemplos de artistas hoje renomados que a arte e a cultura foram as armas que deram oportunidade de construírem suas histórias e tirá-los de outros caminhos. Poze do Rodo e Oruam, por exemplo, jovens negros vindos de comunidades do Rio de Janeiro e que poderiam hoje estar envolvidos com o crime organizado, são referência para a juventude negra favelada através de sua arte. A cultura é salvação e não deve ser criminalizada.
Por esses motivos, e diante da urgência garantir o direito de se expressar culturalmente, submeto este projeto e rogo apreciação desta Casa Legislativa.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Amanda Teixeira Dias. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 3.254/2025, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.
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