Câm. Legislativa de PE – Autoria de Joel da Harpa
O crescimento desregulado das chamadas ‘bets’ no Brasil – apostas digitais altamente acessíveis, com aparência lúdica e apelo a recompensas rápidas – impõe risco direto à formação moral, psicológica e social dos menores. Estudos científicos, documentos da Organização Mundial da Saúde e experiências comparadas em países da União Europeia reconhecem o potencial das apostas para causar ludopatia precoce, evasão escolar, ansiedade, comportamento compulsivo e endividamento familiar.
A presente proposição se ancora no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), que consagra o princípio da proteção integral e da prioridade absoluta, bem como na Constituição Federal, que admite a competência concorrente dos Estados para legislar sobre consumo, publicidade e proteção à infância e juventude (art. 24, incisos V, VIII e XV).
A legislação proposta não proíbe as apostas em si, tampouco interfere na competência federal sobre a regulação do setor. Limita-se a vedar conteúdos publicitários com apelo infantojuvenil e a atuação de empresas e agentes sediados no Estado, como forma de preservar o espaço físico, social e digital das crianças de estímulos economicamente exploratórios.
Não há violação à liberdade econômica, pois a norma visa prevenir danos a grupo vulnerável. Também não se trata de censura ou limitação da liberdade de expressão, mas de controle de publicidade comercial, conforme permitido pelo art. 220, §4º da Constituição, que autoriza restrições à propaganda de produtos nocivos à saúde ou aos valores familiares.
Portanto, a proposta é constitucional, legal e absolutamente legítima, representando um avanço necessário na proteção da infância diante do avanço tecnológico da indústria das apostas online.
Art. 2º Para efeitos desta Lei, consideram-se meios e ambientes de potencial alcance infantojuvenil, entre outros:
I – estabelecimentos de ensino, públicos ou privados;
II – ambientes esportivos, culturais, de lazer ou recreação;
III – plataformas de streaming, redes sociais, canais de vídeo, podcasts, sites e aplicativos com conteúdo livre, educativo, familiar ou destinado ao público jovem;
IV – programas de televisão ou rádio com classificação livre ou destinados à família;
V – revistas, jornais, livros, brinquedos, jogos, peças de vestuário ou objetos com apelo infantojuvenil;
VI – transporte público e respectivos terminais, pontos de embarque e locais com fluxo de estudantes; e
VII – espaços públicos ou privados com presença habitual ou relevante de crianças e adolescentes.
Art. 3º É vedada a utilização, em quaisquer conteúdos publicitários de apostas, dos seguintes recursos:
I – influenciadores, artistas, comunicadores, atletas, personalidades públicas ou personagens com apelo entre o público infantojuvenil;
II – elementos gráficos, audiovisuais ou sonoros que remetam ao universo infantil ou juvenil, tais como mascotes, animações, desenhos, memes, memes em linguagem infantil ou recursos de inteligência artificial simulando crianças;
III – linguagem, estética ou ambientações voltadas ao público infantojuvenil; e
IV – qualquer sugestão de que apostas possam representar fonte de renda, solução financeira, sucesso pessoal ou realização imediata.
Art. 4º Fica vedada a veiculação de conteúdos pagos, impulsionados, patrocinados ou promocionais relacionados a apostas de quota fixa por empresas com sede, filial, representação comercial, agência de publicidade ou atuação no território do Estado de Pernambuco, sempre que tais conteúdos:
I – forem exibidos em ambientes virtuais, físicos ou digitais acessíveis a crianças e adolescentes;
II – sejam promovidos em canais, perfis, páginas, sites ou aplicativos com audiência relevante em Pernambuco; e
III – envolvam influenciadores, atletas ou artistas domiciliados ou atuantes no Estado.
Art. 5º Responderão solidariamente pelas infrações desta Lei.
I – a empresa anunciante que contratar ou financiar o conteúdo irregular;
II – o produtor de conteúdo ou influenciador digital que, direta ou indiretamente, participar da promoção publicitária irregular; e
III – as agências de marketing, plataformas ou intermediários que participarem da difusão do conteúdo ilícito.
§ 1º Considera-se influenciador digital qualquer pessoa física que, por meio de redes sociais, canais digitais ou aplicativos, exerça atividade de comunicação com mais de 10 (dez) mil seguidores, independentemente de monetização formal.
§ 2º A responsabilização independe da existência de vínculo contratual formal, bastando a comprovação da atuação consciente na divulgação.
Art. 6º As infrações às disposições desta Lei sujeitarão os infratores às seguintes sanções:
I – advertência formal, na primeira infração;
II – multa de até R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) por infração;
III – suspensão da atividade publicitária por até 90 (noventa) dias;
IV – interdição temporária de estabelecimento, canal, evento ou plataforma digital; e
V – cassação de licença estadual de funcionamento ou inscrição estadual, no caso de reincidência grave.
Parágrafo único. Os valores arrecadados com multas serão destinados a programas estaduais de prevenção à ludopatia e de proteção à infância.
Art. 7º Os poderes públicos poderão criar Canais de Denúncias sobre Publicidade Irregular de Apostas, sob a coordenação do órgão determinado pelo Poder Executivo, a quem caberá fixar suas atribuições correlatas, entre as quais:
I – receber e processar denúncias;
II – notificar plataformas e anunciantes para remoção de conteúdo irregular no prazo de até 72 (setenta e duas) horas;
III – encaminhar os casos às autoridades competentes, incluindo Ministério Público, Procon, Conselhos Tutelares e Judiciário; e
IV – divulgar relatórios de fiscalização periodicamente.
§ 1º O canal funcionará de forma online, com sigilo assegurado ao denunciante e proteção de dados conforme a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD.
§ 2º O descumprimento das notificações poderá ensejar sanções cíveis, administrativas e comunicação para responsabilização penal.
Art. 8º O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de 60 (sessenta) dias, definindo instrumentos de fiscalização, autuação e execução.
Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
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