Câm. Legislativa de SC – Autoria de Sargento Lima
ESTADO DE SANTA CATARINA SARGENTO LIMA
PROJETO DE LEI
“Dispõe sobre a prevenção e controle da pesca
fantasma, estabelece medidas de manejo sustentável de
equipamentos de pesca e proteção aos ecossistemas
marinhos e costeiros no Estado de Santa Catarina, e dá
outras providências.”
Art. 1º Esta Lei tem por finalidade prevenir, controlar e
mitigar os impactos ambientais decorrentes de petrechos de pesca abandonados,
perdidos ou descartados (PP-APD) nos corpos hídricos estaduais e no litoral
catarinense, promovendo a proteção da biodiversidade marinha e o uso sustentável
dos recursos pesqueiros.
Parágrafo único. São objetivos da presente Lei:
I – Proteger a biodiversidade marinha, em especial espécies
ameaçadas como o peixe-anjo, mero e algumas raias, como a viola, viola-da-cara-curta
e a raia-borboleta;
II – Reduzir a mortalidade de fauna aquática e danos a
ecossistemas sensíveis, como recifes de coral e manguezais;
III – Fomentar a economia circular, incentivando a reciclagem
de materiais de pesca; e
IV – Fortalecer a cooperação entre pescadores artesanais,
setor industrial, órgãos públicos e instituições de pesquisa.
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se:
I – Pesca fantasma: Impacto causado por equipamentos de
pesca (redes, linhas, armadilhas, anzóis etc.) abandonados, perdidos ou descartados
no mar, rios ou zonas costeiras, que continuam a capturar espécies ou degradar
habitats.
II – PP-APD: Sigla para Petrechos de Pesca Abandonados,
Perdidos ou Descartados, compostos majoritariamente por materiais sintéticos como
poliamida (nylon), polietileno e outros plásticos de alta durabilidade.
III – Áreas prioritárias: Zonas de maior incidência de redes
fantasmas no Estado, como a Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, Baía da
Babitonga e entorno de Florianópolis.
IV – Pesca artesanal: atividade realizada por pescadores
autônomos ou em regime de economia familiar, com embarcações de pequeno porte e
menor impacto ambiental.
V – Pesca industrial: atividade realizada por embarcações de
médio ou grande porte, com utilização de redes de grande escala, sistemas
mecanizados e fins predominantemente comerciais.
Art. 3º São vedadas no território catarinense:
I – O descarte intencional de equipamentos de pesca em
corpos hídricos, ressalvadas situações de força maior ou acidentes comprovadamente
comunicados às autoridades competentes; e
II – A pesca industrial sem sistema de rastreamento de
equipamentos em áreas críticas, conforme mapeamento do Instituto do Meio Ambiente
de Santa Catarina (IMA), regulamentado por ato próprio.
Art. 4º São obrigações dos pescadores e empresas
pesqueiras registradas no Estado:
I – Comunicar ao IMA a perda de equipamentos no prazo
máximo de 48 (quarenta e oito) horas;
II – Participar de Programas de Recuperação de Redes
Fantasmas, entregando equipamentos danificados em pontos de coleta credenciados;
e
III – Manter registro atualizado e identificação individualizada
dos equipamentos de pesca utilizados, sempre que tecnicamente viável.
Art. 5º O Poder Executivo Estadual instituirá:
I – O Sistema de Monitoramento de Redes Fantasmas, em
parceria com universidade e instituições de ensino, pesquisa e extensão; e
organizações da sociedade civil, para mapear áreas críticas;
II – O Fundo Estadual de Conservação Marinha, a ser
instituído por lei específica, financiado por multas ambientais e por até 1% (um por
cento) da receita proveniente do turismo costeiro, com destinação prioritária a:
a) remoção de PP-APD;
b) pesquisas e desenvolvimento de materiais sustentáveis; e
c) campanhas educativas em comunidades pesqueiras e
escolares.
III – O Prêmio Santa Catarina Sustentável, para
reconhecimento de iniciativas exemplares de pescadores e empresas comprometidas
com a redução das redes fantasmas.
Art. 6º As empresas com atuação no litoral catarinense
poderão:
I – Destinar voluntariamente parcela de seu lucro líquido
anual a projetos de recuperação de ecossistemas impactados por PP-APD, mediante
convênio com o Poder Público;
II – Instalar dispositivos de escape em redes de pesca,
minimizando a captura acidental de espécies não-alvo, conforme regulamentação
específica; e
III – Substituir gradualmente redes de nylon por alternativas
biodegradáveis, como forma de contribuir para a proteção da biodiversidade marinha e
o uso sustentável dos recursos pesqueiros.
Art. 7º As infrações à presente Lei sujeitarão os infratores às
seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das demais sanções civis, penais ou
administrativas previstas em legislação específica:
I – Multa administrativa de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$
500.000,00 (quinhentos mil reais), a ser fixada conforme os critérios de gravidade da
infração, reincidência, porte do infrator e extensão do dano ambiental, nos termos de
regulamentação do Poder Executivo;
II – Suspensão da licença de pesca por 6 (seis) meses a 3
(três) anos; e
III – Obrigatoriedade de reparação ambiental, sob supervisão
do IMA, conforme dispõe o art. 9º da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.
Art. 8º A fiscalização caberá:
I – Ao Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA);
II – À Polícia Militar Ambiental; e
III – À Secretaria de Estado da Pesca e Aquicultura, nos
limites de suas competências.
Art. 9º O Poder Executivo promoverá ações educativas em
escolas públicas e privadas, colônias de pescadores, cooperativas, feiras e eventos
turísticos, com os seguintes objetivos:
I – Informar sobre os impactos das redes fantasmas na
biodiversidade, na pesca artesanal e no turismo;
II – Promover métodos de descarte responsável e de
reciclagem de petrechos de pesca; e
III – Valorizar as unidades de conservação e a cultura
pesqueira tradicional.
Art. 10. Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após
sua publicação.
Sala das Sessões,
Deputado Sargento Lima
JUSTIFICAÇÃO
A presente proposição tem como escopo combater o grave
problema ambiental conhecido como pesca fantasma, caracterizado pela presença de
petrechos de pesca abandonados, perdidos ou descartados nos corpos hídricos e no
litoral, os quais continuam a capturar espécies aquáticas de forma indiscriminada, além
de poluir os ecossistemas marinhos com materiais plásticos altamente resistentes à
decomposição.
Estima-se que, no Brasil, mais de 25 milhões de animais
marinhos sejam impactados anualmente por redes fantasmas. Em Santa Catarina,
estudos científicos e ações de campo já detectaram a presença desses materiais em
áreas protegidas, como a Reserva Biológica Marinha do Arvoredo, com impactos
diretos sobre espécies ameaçadas, como o mero e a raia-borboleta.
A proposta busca, em consonância com os princípios
constitucionais da função socioambiental dos recursos naturais (art. 225 da CF) e da
sustentabilidade, estabelecer um arcabouço normativo que una prevenção,
monitoramento, fiscalização e educação ambiental, além de incentivar práticas
sustentáveis no setor pesqueiro e fomentar a economia circular por meio da reciclagem
de materiais.
Ressalte-se que a iniciativa se mostra especialmente
relevante diante da ausência de uma política pública federal articulada sobre o tema e
da necessidade de os entes estaduais atuarem para suprir essa lacuna, em
colaboração com universidades, organizações da sociedade civil e comunidades
pesqueiras tradicionais.
Conforme informações da National Geographic, datado de
2020:
– 6,4 milhões de toneladas de lixo marinho chegam aos mares mundiais anualmente;
– 25 milhões de animais marinhos são impactados por pesca fantasma no Brasil por
ano;
– Aproximadamente 580 kg de redes são perdidos na costa brasileira diariamente.
Relatório “Fantasma sob as Ondas”, da ONG Proteção
Animal Mundial, mostrou que, a cada ano, 800 mil toneladas de equipamentos ou
fragmentos de equipamentos de pesca são perdidos ou descartados nos oceanos,
representando 10% (dez porcento) de todo o plástico que entra no oceano e a rede de
plástico pode demorar até 600 anos para se degradar.
Os petrechos de pesca ficam centenas de anos vagando nas
águas dos mares e capturando involuntariamente os animais. E, depois que esse
material, essencialmente feito de plástico, se decompõe, surge outro problema: a
proliferação do microplástico nos oceanos.
O estudo Maré Fantasma, conduzido pela Organização
Proteção Animal Mundial, estima que, em um ano, 25 milhões de animais marinhos na
costa brasileira podem ter sido impactados pelos petrechos (morte, mutilação,
ferimentos ou aprisionamento).
Há pouca pesquisa dedicada à pesca fantasma no Brasil.
Somente três estados (São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina) têm estudos de
cunho científico, com registros sobre a retirada de petrechos fantasmas. A somatória de
dados disponíveis nessa pesquisa, além de relatos de agências de mergulho e limpeza
de praia, aponta que, em pelo menos 70% (setenta porcento) do litoral brasileiro, há
relatos de petrechos abandonados ou perdidos.
Relato da Ocean Cleanup Foundation: ao menos 136.000
baleias, focas, leões-marinhos, tartarugas e golfinhos, além de inumeráveis peixes e
aves, enredam-se em equipamentos fantasmas por ano na região da Indonésia. No
Equador, onde a pesca é vital, documentos de 2024 mostram que as redes fantasmas
afetam Galápagos, área reconhecida como Patrimônio da Humanidade, atingindo
espécies como tartarugas-marinhas e tubarões-martelo.
Já em levantamento feito em 12 pontos nas quatro ilhas que
compõem a unidade de conservação Ilha do Arvoredo foram identificados PP-APD,
coletou-se chumbada, isca artificial, anzol, amostras de linhas e redes de emalhe,
sendo as linhas, redes e cabos os mais frequentes. Estes petrechos são provenientes
principalmente da pesca ilegal praticada na unidade de conservação, especialmente
pesca amadora e profissional artesanal.
A Reserva do Arvoredo apresenta 1.400 espécies marinhas
registradas em trabalhos científicos (até 2017). Algumas estão incluídas na lista
internacional de espécies ameaçadas da União Internacional para a Conservação da
Natureza e dos Recursos Naturais, entre elas peixe-anjo, mero e algumas raias, como
a viola, viola-da-cara-curta e a raia-borboleta. De 2009 a 2016, o ICMBio emitiu 96
autos de infração por pesca irregular no Arvoredo, sendo a ampla maioria por pesca
com rede de emalhe e vara de pesca, em embarcações de lazer.
A presente proposta encontra respaldo nos dispositivos da
Constituição Federal (arts. 23, 24 e 225), bem como na Lei nº 11.959/2009 (Lei da
Pesca), na Lei nº 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos), na Lei nº
9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais) e na Lei nº 13.123/2015 (Lei da Biodiversidade).
Deste modo, esta proposição contribui para a preservação da
biodiversidade, a valorização da pesca artesanal sustentável, e a segurança da
navegação, alinhando-se aos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em
matéria ambiental, e fortalecendo a atuação do Estado de Santa Catarina como
referência em proteção costeira e marinha.
Sala das Sessões,
Deputado Sargento Lima
ELEGIS
Documento assinado eletronicamente por Carlos Henrique de
Sistema de Processo
Lima, em 12/08/2025, às 17:22.
Legislativo Eletrônico
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